Não obstante, assim pensarem, insistem que elas, veIas ou lâmpadas devem existir, em número definido e invariável para cada circunstância ou grau.

O simples fato de aceitarem que essas Luminárias devem ser colocadas em posições predeterminadas para cada ato litúrgico e em quantidade exata, implica na aceitação de que há um ritualismo a cercá-las e, conseqüentemente, um misticismo implícito. Se assim não fosse, não haveria por que determinar com exatidão seu número e sua localização. Se aceitarmos esses fatos, estamos atribuindo um caráter litúrgico às nossas luzes ritualísticas e portanto místico, porque toda liturgia é uma ponte para o misticismo.

Defende-se intransigentemente a obediência à tradição em nossos trabalhos e vela-se cuidadosamente para que nossos rituais sejam seguidos, com toda correção, e se mantenham, o mais possível, fiéis aos de nossas Lojas primitivas Estas sempre usaram velas em seus altares, velas que fazem parte integrante de nossas mais caras tradições. Mas por que velas serão diferentes de lâmpadas. As velas, sempre de cera pura de abelhas, como manda a tradição, emitem uma chama pura e sem fuligem, emitem fogo, o que não acontece com as lâmpadas elétricas. O fogo sempre acompanhou a humanidade desde os mais primitivos ancestrais, e nesta sua marcha através da história foi assumindo sempre mais o aspecto de elo de ligação entre o homem e os espíritos, entre o homem e Deus. A primeira prova inequívoca de que o homem usava o fogo em seu dia-a-dia apareceu na caverna de Chucutien, na China, onde, junto aos achados arqueológicos do “Homem de Pequim” (Sinantropus), encontraram se restos de fogueiras não acidentais. Esse homem viveu há cerca de 40O mil anos. Junto às cinzas se encontraram também sinais evidentes de que esse hominídeo já enterrava os seus mortos com rituais, pois junto às sepulturas se localizaram restos fósseis evidentes de pólens de quase todas as flores da região. A conclusão é evidente. Os cadáveres foram sepultados rodeados de flores, ilumina cerimônia obviamente ritualística.

Sem muito esforço, poderemos imaginar a cena com os nossos primitivos ancestrais amuados no fundo de suas cavernas, apreensivos e temerosos ante o fulgor dos relâmpagos a iluminar as paredes de sua morada. Podemos até conceber o seu temor e o seu espanto ante os raios e os vulcões e ante os ocasionais incêndios nas inatas de seus territórios de caça, e a ameaçar as suas vidas.

O medo do fogo faz parte de nossa natureza humana e, também da natureza dos animais irracionais. É freqüente vermos animais retratados fugindo do fogo como que alucinados, provavelmente resquícios Inconscientes dos traumas provocados por este fenômeno ainda em tempos remotos. Nós, humanos tememos tanto o fogo que a simples menção desta palavra em algum recinto fechado leva ao pânico e ao desastre. Há um medo incontido em todos os seres vivos, homens e animais. Mas o homem dominou o fogo. Primeiro aprendeu a conservá-lo quando colhido em eventuais fogueiras naturais e depois descobriu também como fazê-lo. Não sabemos se o Homem de Pequim já o sabia, sabemos apenas que o usava. Ainda hoje há tribos de pigmeus no centro da África que ainda não aprenderam a técnica de fazê-lo.

Desde os primitivos tempos, deve o fogo ter sido tratado com grande respeito, tanto pela utilidade, como em virtude dos danos que sempre trazia consigo sua ligação com a divindade vem de tempos imemoriais, assim o atestam as inumeráveis lendas que correm entre os povos primitivos a seu a respeito, todas dando-lhes uma origem celeste.

Os índios Navajos, dos Estados Unidos, cultuam a lenda do Grande Coiote que roubou o fogo dos deuses e o deu de presente aos homens. Ela é muito semelhante ao mito de Prometeu, que também roubou o fogo dos céus e o trouxe para os homens. Também entre os índios brasileiros se conta que um pássaro foi ao sol buscar o fogo e que, tendo-o segurado com o bico, ficou com ele vermelho para sempre (daí a origem das aves de bico vermelho). Há muitas outras lendas semelhantes junto a outros povos primitivos. Os gregos tinham a deusa Héstia, protetora do fogo doméstico; os romanos a deusa Vesta, protetora também dos espíritos e do fogo doméstico. Ligados a esta última havia a comunidade das Vestais, jovens virgens encarregadas de zelar pela conservação permanente do fogo sagrado; os descuidos eram punidos com a pena de morte. Não poderemos deixar de mencionar a mitologia egípcia da Fênix, um grande pássaro que tinha vida eterna, morrendo pelo fogo, mas sempre renascendo das cinzas.

Temos, ainda, as lâmpadas votivas dos templos e igrejas, simbolizando a presença divina permanente; nas igrejas católicas esta luminária indica a existência de hóstias consagradas, rias quais está presente Deus em pessoa.

O fogo, desde que o homem começou a percebê-lo conscientemente como um dos elementos da natureza, foi sempre olhado como um elemento mágico de origem divina, pois Deus usava-o tanto para iluminar seus diletos filhos, como para castigar os que incorriam em sua ira por desobediência aos seus preceitos. Considerava-o como um elemento de purificação e castigo (purgatório – inferno). Isto, naturalmente, quando não era adorado como o próprio Deus, dada a sua misteriosa origem e seus misteriosos efeitos. Houve muitas culturas que mantiveram, e que ainda mantêm um verdadeiro culto sagrado do fogo. Esse culto, ria sombria pré-história do homem, deve ter se originado ria ansiosa necessidade de sua conservação, já que a técnica de fazê-lo foi aprendida muito mais tarde.

Aos poucos esse misticismo todo em torno do fogo o tornou um verdadeiro agregador social, reunindo os membros do grupo em suas cavernas, para se aquecerem e afastar as teias. As ondas de calor, o cheiro inebriante das madeiras queimando, o crepitar das labaredas, as nuances bruxuleante das chamas os rostos e corpos semi-iluminados ao clarão vermelho, tudo isto deve ter provocado uma sensação enlevante e muito próxima ao espiritual.

Essa fascinação, após terminado o dia e quando começa a misteriosa noite, e a aproximação dos espíritos das trevas que se julgava virem com ela, naturalmente levaram os primitivos hominídeos a fazer do fogo o centro de suas atenções e de seus rituais. Os escoteiros, ainda hoje, realizam seus atos mais solenes ao redor do seu fogo de conselho, e ali encerram suas reuniões mais importantes com a cadeia de união.

A intromissão desse elemento natural em todos os atos humanos, a sua divinização, o seu caráter ritualístico, fez com que sempre fosse cercado de respeito e de inúmeras crendices populares. Não se pode, sem atrair desgraças, urinar no fogo, empurrar tições com os pés, apagá-lo com água, acender sobre fogueira extinta (fogo morto), e muitas outras mais.

Os alquímicos o usavam como seu instrumento predileto, derretendo seus metais, purificando o ouro, obtendo o mercúrio e o enxofre, seus materiais prediletos. Considerando-o a ferramenta ideal para alteração da matéria existente, usavam-no ria tentativa de transformar tudo em ouro, não para ficarem ricos, mas para tornar incorruptível o corruptível. Segundo a mitiga sabedoria, já desde os babilônios ele era considerado um dos quatro elementos que compunham todas as matérias visíveis, porém, enquanto o ar, a água e a terra podiam abrigar habitantes, no fogo não podia habitar nem mesmo a salamandra. Não é de se admirar, portanto, que ainda hoje a mística que cerca o fogo faça com que continue ainda a ser considerado unia espécie de mediador entre Deus e os homens, o símbolo do Espírito Santo, da iluminação da alma, símbolo do amor, da pátria, do lar.

É conhecido que, biologicamente falando, somente se transmitem aos descendentes características genéticas quando absolutamente indispensáveis à sobrevivência da espécie. É certo, outrossim, que rias épocas das grandes glaciações o fogo se. tornou um elemento indispensável à sobrevivência do homem, e daí rios parece lícito concluir que certo tipo de comportamento em relação a esse elemento natural, como o pânico que ele causa, o embevecimento ante as chamas e o seu fulgor místico, essa reação quase sensual que ele cria em nós, são transmissões genéticas que rios acompanham de geração em geração.

Quando o homem tendeu ao aperfeiçoamento de seus rituais, e a realizá-los nos recônditos de suas cavernas tornando-os aos poucos secretos, não houve mais possibilidade de acender fogueiras. Foi mister passar ao uso de objetos mais práticos para manter o fogo sagrado, como tochas, por exemplo. Posteriormente, com a invenção das velas, feitas de cera de abelhas, obteve se uma chama pura e praticamente isenta de fuligem, mais prática para uso em recintos fechados e ocultos.

Muita dessas tradições se fixaram e permaneceram até os nossos dias. As igrejas, em suas cerimônias religiosas, não permitem o uso de velas que não sejam produzidas de cera pura de abelhas, como a Igreja Católica. A vela se tornou um fogo simbólico e ritualístico, mantendo acesa a chama sagrada em nossas reuniões, como o faziam nossos ancestrais em suas moradas primitivas.

Todo o Iniciado recebe a Luz. Este tipo de Iniciação está muito bem simbolizado no Novo Testamento quando os apóstolos receberam a Luz do Espírito Santo sob a forma de urna língua de fogo descendo dos céus. Portanto, o Iniciado recebe uma Luz vinda do alto, do poder de Deus, vinda do fogo infinito, da imortalidade simbolizado no ato iniciatório pela chama da vela. A chama simboliza a sabedoria dos iluminados. Os três altares dos Poderes que governam nossas Lojas têm, nas velas o símbolo da sua sabedoria, de sua iluminação, como era um símbolo de iluminação a chama que veio dos céus trazer o Espírito Santo, a iluminação, para os Apóstolos.

As velas são ainda, com suas chamas, o símbolo da transformação a que se deve submeter permanentemente o maçom na sua busca incansável pelo aperfeiçoamento pessoal. O fogo não é uma matéria como o criam os antigos sábios, ele é um, processo de transformação como a Maçonaria também é um processo, uma luta contra a incompreensão. As luzes em nossas Lojas não são meramente decorativas ou instrumentos de iluminação. São objetos ritualísticos e de simbologia. muito profunda. Sua substituição por lâmpadas elétricas é quase uma afronta, às nossas mais caras tradições; lâmpada elétrica não emite chama, não tem simbologia, não tem misticismo.

O uso da eletricidade em nossos altares nos parece um comodismo que deveria ser abolido, pois não se coaduna com as nossas mais caras tradições, nem com nossa ânsia de misticismo, sempre reforçada pela luz das velas. As velas, com sua chama limpa e multicolor cheia de nuances, são um símbolo de sabedoria, de iluminação interna, de transformação espiritual: não deixemos morrer essa tradição.

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