“Conhece-te a ti mesmo” (aforismo grego atribuído A diversas personalidades da Grécia antiga, especialmente A Sócrates).

Logo cedo, ao acordar, percebi que 24 de agosto de 2013 tratar-se-ia de um dia diferente, de uma data ímpar em minha vida. Por certo que já estava cônscio da minha iniciação maçônica, mesmo porque tinha participado de todos os trâmites burocráticos que antecederam meu ingresso aos quadros dessa Sublime Instituição, além do fato de todos os Irmãos que já conhecia na vida profana terem me antecipado a beleza peculiar da liturgia iniciática. Todavia, ao abrir meus olhos nesse dia, notei uma atmosfera distinta, pressentindo o auxílio dos entes superiores desde o alvorecer, conferindo-me a tranquilidade necessária para asserenar a ansiedade inerente à cerimônia que me aguardava. Assim, já vislumbrava, ainda que em forma de uma réstia de luz, a grandiosidade do evento iniciático.

E foi sustido nessa atmosfera que, no horário aprazado, fui apanhado em casa pelo meu padrinho Sérgio Diniz, em conjunto com o Amado Irmão Bernardino de Campos. Quando da saída do lar, após despedir-me de minha valorosa mulher e ouvir do confrade Bernardino, ao dirigir-se a ela com as seguintes palavras: “hoje você entrega a nós uma pessoa e, após, devolver-lhe-emos um homem muito melhor”, pude aquilatar ainda mais o significado especial daquilo que iria passar horas depois. Deste instante em diante, fui tomado de um sentimento inexpressível, algo sublime, que em poucos momentos de minha 
vida experimentei.

Antes de nos dirigirmos ao Templo, fomos a indústria do Amado Irmão Garibaldi, oportunidade na qual, através do exemplo da forja dos resquícios de metal imprestável em puro aço, tive a magnífica lição do poder transformador do fogo, que tornava algo sem utilidade aparente em matéria-prima de significativo valor.
Após, ao passarmos na residência do Amado Irmão Carlos Gomes, foi-me ministrada uma das maiores lições sobre o poder da água, que sustenta todo o orbe terrestre, mas que, todavia, ao mesmo tempo que sacia a sede, oportunizando a vida, em excesso pode causar sua extinção.

Com o processo iniciático em curso, dirigimo-nos ao Templo, onde, enquanto estava sendo vendado, com ar paterno, ouvi de meu padrinho para me manter calmo e sereno, dizendo “não se preocupe, tudo é simbólico, estás protegido pelos Irmãos”. Ainda, frisou ele, para atentar-me sobre tudo o que estava prestes a ocorrer, pois seria de grande valia para minha vida maçônica, azo em que me confiava à prudência do Irmão Terrível. Daí por diante, fui privado da visão.

Desde então, em razão do tolhimento de um dos sentidos, percebi que os outros se aguçavam na medida em que o tempo passava. De tudo ouvia, os passos, as músicas, mesmo recolhido na Câmara de Reflexões, sentia os odores da cerimônia. No transcorrer do processo iniciático pude desenvolver um pouco mais o tato e o paladar, sobretudo este último, ao beber do cálice o líquido doce que, posteriormente, tornou-se amargo como fel. E assim percebi que, em verdade, apenas minha visão material estava comprometida, pois os “olhos espirituais” continuavam abertos, “enxergando” de tudo, sentindo toda a irradiação positiva emanada dos Irmãos encarnados e desencarnados, responsáveis pelo drama iniciático, participando efetivamente de todo este belo e profundo processo. Não foram poucas as vezes que 
me emocionei.

Deixado na Câmara de Reflexões, não obstante em silêncio físico, em sintonia com o GADU, minhas faculdades mentais não se estacionaram sequer por um segundo. Era como se passasse na minha mente, naquelas poucas horas que ali fiquei vendado, o “filme da minha vida”. Fui tomado por um turbilhão de indagações: Por que existimos? Por que nasci na minha família? Por que Deus me confiou a minha esposa? Por que me foi oportunizada a vida terrena? Por que exerço minha profissão profana? Qual o meu papel na providência Divina? Estou exercendo o contento? Sou um bom filho, um bom amigo, um bom profissional, um bom cidadão, um bom marido?, enfim, por que estava ali? Ao responder às perguntas notei que os meus vícios superam em muito minhas virtudes, que ainda tenho muito a experimentar e a aprender. Por outro lado, fiquei feliz por ali estar, posto que já antevia que a Maçonaria seria uma grande escola para aperfeiçoar-me moral e intelectualmente.

Embora eu nada pudesse ver, revivia cada momento importante da minha vida: os contatos íntimos com meus pais, o nascimento de minha irmã, os familiares e amigos encarnados e aqueles que partiram para o Oriente Eterno, minha formatura, minha posse na profissão profana, minha nova “família de Rondônia”, o dia em que conheci minha esposa, meus primeiros passos dentro da Doutrina Espírita, meu casamento (outro dia inolvidável)… Não pude conter as lágrimas, pois naquele exato momento percebi o quanto Deus foi e é generoso comigo.

Retirada, temporariamente, a venda, ainda na Câmara de Reflexões, quando tive contato com o testamento e o questionário filosófico, notei que o velho Pablo, aquele vinculado aos laços deletérios da matéria, ao vício destemperado, orgulhoso, vaidoso, egoísta, estaria prestes a adormecer. Que o Grande Arquiteto do Universo, naquela oportunidade, estava me propiciando um novo começar, um nascer de novo, um recomeçar, um renascimento, uma nova vida. Desta feita, já amparado pela experiência dos anos vividos, pela família constituída, agora acrescida dos Amados Irmãos, que certamente estariam a me auxiliar na nova caminhada, compreendi o convite a livrar-me dos vícios e a desenvolver as virtudes. Assim, agradeci novamente por ali estar e, antes mesmo do juramento formal, comprometi-me com o Grande Arquiteto do Universo em desenvolver minha estada terrena e auxiliá-lo na Sua obra.

Ao integrar a Oficina, ainda somente com a visão espiritual, subi e desci escadas, atravessei por estreitos túneis e realizei três viagens, cada qual com suas provas peculiares. Ouvi fortes ruídos, trovoadas, arrastar de correntes, pulei obstáculos, rastejei no solo, assustei-me com o entrechocar de espadas, senti como se estivesse passando no meio de uma batalha, sensações estas oportunizadas para notar o quão difícil é perpassar pelas atribulações da vida, pelos caminhos tortuosos decorrentes da nossa condição profana pouco evoluída e viciada, mas que, suportado na fé, esperança, amor e reflexão, dão ensejo à calmaria posterior e às virtudes enriquecedoras, afinal de contas, as dificuldades por nós enfrentadas nada mais são do que oportunidades de aprendizado. Descobri que com o fortalecimento do espírito, mediante o aprimoramento moral e intelectual, e com o amparo dos Amados Irmãos, superamos com segurança as adversidades da vida.

Exitoso nas viagens, fiz o juramento formal, que reforçou o já anterior juramento espiritual feito com o Grande Arquiteto do Universo na Câmara de Reflexões. Embora nada pudesse ver, sentia como se uma imensa luz estivesse sempre a me iluminar.

E foi assim que, em um determinado momento da cerimônia, ouvi de uma pessoa que então desconhecia, mas que parecia comandar o ato solene: “FAÇA-SE A LUZ!”, azo em que fui desvendado e notei conhecidos e desconhecidos a apontarem espadas contra meu peito. Eis o período que, não obstante tenha perdurado por poucos minutos, para mim foi como se durasse uma eternidade.

Lembrei-me da vida de Saulo de Tarso, então Doutor do Sinédrio, exímio articulador e defensor destemido das Leis Mosaicas, perseguidor implacável dos cristãos, quando nas portas de Damasco, em busca a um cristão de nome Ananias, que seria julgado pelos hebreus só por amar e pregar a Lei do Cristo, ao vislumbrar um clarão gigantesco, que culminou com sua queda do cavalo, teve a visão comprometida e, cego, viu Jesus Cristo em espírito, paladino dos que ele caçava, a indagar-lhe: “Saulo, por que me persegues?”. Saulo, notando a grandiosidade do momento, envolto na energia benfazeja que emanava daquele Espírito de Luz, acometido por um sentimento inolvidável e indescritível, de suma bondade e sublimação, prostrou-se de joelhos no solo e, já convertido cristão, redarguiu ao Grande Mestre: “Senhor, o que queres que eu faça?”. Dias após, quando teve sua visão recuperada por Ananias, quando esse discípulo de Cristo, justamente o que Saulo perseguia em Damasco para prendê-lo e julgá-lo, restitui-lhe a faculdade visual, Saulo deixa sua vida mundana, ligada umbilicalmente às vicissitudes da matéria para trás, tornando-se Paulo de Tarso, passando de perseguidor a perseguido, certamente um dos maiores, senão o maior, discípulo de Jesus Cristo que esse planeta Terra já serviu de morada.
Desvendado, quando restituída a minha visão, desta feita com a verdadeira luz, tal qual Saulo, foi-me tirado tudo que de material, que de profano havia, inclusive o nome, e aqueles que antes me ameaçavam com espadas, agora as desembainhavam para me proteger, tornando-se meus defensores mais assíduos.

Nascia, assim, FRANCISCO LEITE DE BITTENCOURT SAMPAIO (não por acaso, outro árduo defensor do cristianismo). Renasci naquele instante para, de homem livre e de bons costumes passar a ser um eterno aprendiz, para com o desbastar diuturno da minha pedra bruta lutar com a finalidade de levantar Templos à virtude, forjar algemas ao vício e cavar masmorras ao crime, para contribuir, enfim, com a providência Divina, em busca do aprimoramento moral, intelectual e social da humanidade.

Só restou-me, ao final, agradecer a Deus, à família, ao meu padrinho, aos amigos e aos Amados Irmãos, por terem me propiciado tal momento sublime e, certamente, inesquecível.

Bibliografia:

– Maçonaria 100 Instruções de Aprendiz – Raymundo D’Elia Júnior – Ed. Madras;
– Ritual do Rito Adonhiramita – 1º Grau – Aprendiz Maçom;
– Paulo e Estevão – Francisco Cândido Xavier, pelo espírito Emmanuel – Ed. FEB.

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