No princípio era o Uno. Imóvel, Atemporal, Amorfo, Absoluto. Ao mesmo tempo Sujeito e Objeto. Ao mesmo tempo o Tudo e o Nada. E tomou pois o Senhor Deus ao Homem e pô-lo no Paraíso das Delícias. Éden, jardim das delícias, paraíso perfeito… mas de uma tosca perfeição por não haver contraste com o seu oposto, a imperfeição, que Deus ainda não criara. E o Senhor deu ao Homem uma ordem: – Come de todos os frutos das árvores do Paraíso, mas não comas do fruto da árvore da Ciência do Bem e do Mal. – Porque se dela comeres, morrerás. Nasceu assim a Lei (não comas) e o Castigo (morrerás). Nasceu assim a Dualidade: Causa e Efeito, Lei do Karma. A Serpente, todavia, que era o mais astuto de todos os Seres Vivente, disse à Mulher: – Porque vos mandou Deus que não comesses dos frutos de todas as árvores do Paraíso? Respondeu a Mulher: – Podemos sim comer de todos os frutos, menos daquele que está no meio do Paraíso, porque se o comermos…morreremos. Retrucou a Serpente: Certamente Deus sabe que não morrereis. No dia em que dele comerdes se abrirão os vossos olhos…e sereis como Ele, que conhece o Bem e o Mal. A Serpente, ou Sophia, astuta, ao indagar por que todas as árvores estavam interditadas quis, ao invés de se arriscar numa iniciativa pessoal, incentivar a Mulher a agir. Fingindo ingenuidade, levou a vítima a se crer astuta e pôde, assim, comanda-la. A Serpente, ou Sophia, o mais astuto de todos os Seres Viventes, foi a única a entender o Senhor. Pois se Deus quisesse a permanência eterna do Homem no Paraíso, teria suprimido a Árvore da Ciência do Bem e do Mal, eliminando, assim, o caminho que leva à desobediência. Mas, quem constrói a estrada, quer o seu percurso. O que Deus planejou, a Serpente intuiu que deveria ser cumprido. E para cumprir, seria necessário obedecer desobedecendo, pois o Bem e o Mal, tendo sido idealizados… deveriam ser concretizados. Não fosse assim, o Senhor não os teria colocado no meio do Paraíso. No princípio era o Uno, que buscava se transformar no Todo. E no entanto, na própria busca, obstinado, o Uno sempre reaparece: no coletivo, onde um são muitos; na cópula, onde dois são um; na gravidez, onde um são dois; na comunhão, onde todos são um. O Uno evolvendo para o Todo e o Todo retornando para o Uno. É a Lei dos Ciclos…a mais perfeita realização da Eternidade. Num estéril Jardim, onde nada acontecia, vegetavam inúteis Adão, Eva, a Serpente. Até que o Senhor, pela armadilha da proibição, criou a desobediência, o primeiro acontecimento. Nascia, assim a Polaridade, que gera o atrito e conduz á Evolução. Adão, vivendo no Paraíso, desconhecia o apetite e a fome. Deus, ao ordenar que comesse de todos os frutos, criou o gozo do apetite… e ao proibir um deles, criou o sofrimento do desejo. Findava o Paraíso. Paraíso do qual Adão e Eva se conscientizaram apenas quando o perderam; enquanto existia, era insípido. Tão insípido que o Senhor quis muda-lo. E mudou, estimulando a transgressão. Quem ameaça (se comeres, morrerás) admite a possibilidade de ser contrariado. O Senhor, Onipotente, se quisesse, inviabilizaria a resistência não colocando nada no meio do Paraíso. Mas no caso, colocou. E estranhamente falou, de modo negativo: “não comas”. E mais…ofereceu ainda uma alternativa: “pois se comeres morrerás. A morte, ignorada no Paraíso, era mistério… e mais fascinava que amedrontava. Assim, Adão e Eva comeram o fruto, descobrindo a Polaridade: Vida, Morte, Bem, Mal… Bem e Mal que, ilusórios, facilmente se invertem e contradizem. Pois se foi um Mal desobedecer, por nos privar do Paraíso, foi Bem, por nos propiciar a Evolução, tendo em vista que o Paraíso seria Estagnação. Desobedecer foi ruim por infringir a letra morta da ordem, mas foi bom por cumprir o seu espírito Aliás, o próprio Mal é Bom, já que o sofrimento purifica. E o Bem, aliviando, é mau porque o conforto corrompe. Até mesmo Deus, misericordioso, ao nos tirar do pó, mostra-se perverso quando ao pó nos devolve. O Homem, então, confuso, conceituou: O que agrada, e é bom, vem de Deus. O que desagrada. E é mau, vem do Diabo (Lúcifer) E tudo, na verdade, só pode vir do Criador, sob pena d’Ele não o ser. Lúcifer e Jeovah, portanto, encarnam as duas faces do Uno, que a nossa fantasia chama de Lúcifer quando mata e de Jeovah quando cria. O Mal e o Bem, ora, são apenas máscaras do Uno, que apelidamos de Senhor quando nos nutre e Demõnio se nos deixa famintos. Mas foi realmente necessário, no princípio, contrapor o Bem ao Mal, pois sem esse imenso contraste, permaneceríamos eternamente estagnados no Paraíso. Leave a ReplyYour email address will not be published.CommentName* Email* Website Salvar meus dados neste navegador para a próxima vez que eu comentar. Δ