1. Introdução

Próximo de completar 5 anos na jornada maçônica, dentre os fatos que presenciei, alguns compreenderam a leitura do pedido em caráter irrevogável, o conhecido ‘quite placet’.

Visando amadurecer as percepções, somei conversas com diversos Irmãos, ora de outras oficinas, ora de outras potências ou obediências, buscando entender um pouco do que vem ocorrendo entre as colunas da Ordem.

Diante disso, almejando contribuir para mitigar essa epidemia que tanto esvazia nossas Oficinas, o presente trabalho tem por objetivo provocar reflexões sobre a origem do Quite Placet na jornada maçônica.

2. A proximidade entre o início e o fim

Geralmente, o primeiro passo é a desmotivação para frequentar as sessões, ora porque as pautas da Ordem do Dia estão vazias ou preenchidas com temas de pouca relevância na percepção do Irmão, que esquece ser também um dever dele contribuir para essas pautas.

O segundo passo é o Irmão deixar de ter contato com os Irmãos da Loja, mesmo sem frequentar as sessões.

O terceiro passo é a Loja deixar de buscar o Irmão, desistindo de resgatá-lo da sua condição confusa ou insegura.

A sequência é derradeira (o quarto passo), podendo ser acelerada ao surgir um problema de relacionamento com algum Irmão ou ainda a ocorrência de algum episódio de falha administrativa como esquecer-se de enviar flores no aniversário da cunhada, ou esquecer-se de citar alguma data festiva da família na sessão, ou ainda alguma fagulha no demasiado discurso ao final de uma sessão.

Relatado esses quatro passos que ligam o início e o fim, refletiremos brevemente sobre cada um deles. Vale ressaltar que pelas observações e conversas, a maioria dos ‘quites’ são solicitados entre o segundo e terceiro passo, culminando numa licença e quando ocorre na altura do quarto passo, geralmente o Irmão se filia a outra Oficina.

3. Primeiro passo: Hoje eu não irei à sessão

Chegou o dia da sessão e desde cedo, a alegria de reencontrar os Irmãos é substituída pela apreensão: – Nossa hoje é dia de sessão! Não estou com a mínima vontade de ir lá! De novo vai ser discutido o mesmo assunto! Ninguém vai apresentar nada interessante no Tempo de Estudos e ainda poderá sobrar pra eu fazer algum trabalho para a próxima sessão.

Além disso, vai que estejam precisando de alguém para alguma comissão? Tô fora! Não tenho tempo pra mim!

Essa desmotivação se inflama ao somar os compromissos profissionais, o trânsito, a conciliação e equilíbrio da vida familiar e a pura vontade de ir para casa descansar.

Uma sessão, duas sessões, um mês e de repente meses, anos, levando o Irmão a uma desconexão dos assuntos e da harmonia dos trabalhos em Loja.

4. Segundo passo: Seguindo solitário

Deixar de frequentar a Loja é um problema, porém perder o contato com os Irmãos é um sinal grave de que estamos nos afastando do porto. Não há mais tempo ou ocasião para um almoço, um churrasco, um encontro num barzinho ou na Igreja, um telefonema, uma mensagem do Whatsapp, levando também a perda de contato entre as cunhadas e sobrinhos.

Soma-se a ausência nos eventos festivos da Loja, deixando claro que o Irmão está em outro plano, ou sem plano nenhum.

5. Terceiro passo: Livre para voar ou cair

Depois de não frequentar as sessões e perder o contato e convivência, o momento derradeiro dá seus sinais, pois a Loja mostra indícios de que já não consegue resgatar o Irmão.

Ligações sem retorno, e-mails sem resposta, mensagens de Whatsapp lidas e não respondidas, ausência em sessões magnas, ausência nas confraternizações, e chega o momento da Loja deixar o Irmão refletir o que fará em sua jornada maçônica. É uma queda de braço que os dois perdem, mas existe um limite entre gritar e não ser ouvido também em ambos os lados. Pelo lado do Irmão, será que ele não está precisando de algo que ainda não foi descoberto? Pelo lado da Loja, será que o Irmão não se sente livre o bastante para se colocar entre colunas e abrir seu coração e suas angústias? E o padrinho desse Irmão, será que está atento ou foi acionado até esse estágio?

Aqui, nesse momento, aparecem Irmãos sim, mas para ruminar defeitos da Oficina que ele faz parte e tentar levá-los à outras Lojas, ajudando a enterrar uma relação que deveria ser mais forte.

Inicia-se então o período de visitar outras Lojas, inspirado pela ideia de que só a sua Loja não é perfeita. Rapidamente, chega informação aos quadros da Loja que aquele Irmão ausente e inativo está visitando outras Oficinas e continua sem visitar sua Loja oficial.

Momento livre para voar ou cair.

6. Quarto passo: Tempestade em copo d’água

A ponte entre o início e fim está prestes a ser concluída. Primeiramente o Irmão não frequenta as sessões perdendo o jogo de cintura com a harmonia e assuntos da Loja.

Depois, deixa de ter contato com os Irmãos, afastando-se da convivência fraterna que tanto enriquece a jornada maçônica, e porque não dizer que é um dos grandes tesouros da Ordem.

Desgastada pela resistência do Irmão em retornar aos quadros, a Loja desiste temporariamente do resgate, procurando revigorar forças e ações.

Infelizmente é nessa fase que qualquer evento, por menor que seja, será suficiente para promover um turbilhão de polêmicas e arrebentar o último fio que prendia a esperança de manter a ligação com a Loja.

De discussão político-partidária, lamúrias por não ter cargo em Loja, como se faz um nó de gravata, qual a sobremesa do jantar, ou qual é a posição do dedão do pé dentro do sapato quando se está em Loja. Qualquer motivo servirá para disparar uma discussão, uma pauta inconclusiva e um pedido distante de perdão e reconsideração.

Agora, é só aguardar o pedido.

7. Presença física, ausência mental e espiritual

Os quatro passos comentados partiram de uma premissa que o Irmão estaria ausente das sessões. Porém, em paralelo a esses quatro passos, temos também aqueles que frequentam as sessões, mas estão ausentes, igualmente desmotivados, sem conviver com os Irmãos e a Loja sem tentar o seu resgate, já que ele está ali…teoricamente presente.

Basta notar, em face da sua desmotivação, o uso do telefone durante as sessões, dispersando totalmente dos temas tratados. Esse Irmão também não se levanta mais para falar ao final da sessão e pouco se sabe sobre a sua vida, embora esteja frequentando assiduamente as sessões.

Não apresenta trabalhos e quando assim o faz percebe-se um árduo cumprimento de obrigação, e não uma edificação pessoal para partilhar com os Irmãos.

Está mais afiado para criticar do que sugerir e contribuir com alguma ação na administração da Loja.

Esse Irmão, a meu ver, está tão ‘placetado’ quanto o outro que percorreu os quatro passos, sendo a única diferença que está fisicamente presente nas sessões e não está atraindo a atenção da Loja sobre seus sintomas.

8. Considerações Finais

O presente trabalho teve por objetivo apresentar algumas breves reflexões sobre ‘o quite placet e suas origens’, abordando na percepção do Irmão autor, os quatro passos a serem percebidos e combatidos para evitar a saída do Irmão, quais sejam: (i) ausência; (ii) distanciamento; (iii) abandono da Loja; e (iv) incidentes não resolvidos ou esclarecidos. Por fim, se chamou também a atenção para os casos em que o Irmão frequenta apenas fisicamente as sessões, mas sua direção aponta para fora da Loja.

Arriscaria dizer que para alguns Irmãos, só falta alguém redigir para eles o quite, pois ainda não o redigiram por desconhecimento e por total afastamento da prática e estudo dos documentos da Ordem.

Assim, a vigilância e persistência devem ser firmes e constantes, para primeiro fazer com que o Irmão se sinta a vontade para trazer suas desmotivações perante os Irmãos e segundo para a Loja, ter a mesma liberdade em corrigir e resgatar o Irmão sempre que necessário. Embora seja um tema bastante difundido, o papel do Padrinho é singular na vida do Irmão e poderia ser aprofundado em outro Tempo de Estudo.

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ARBLS Prof. Hermínio Blackman, n° 1761 Oriente de Vila Velha • GOB/ES

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