1. Contexto maçônico brasileiro

A Maçonaria brasileira tem um passado de glórias e realizações. Contudo, desde seus primórdios teve inúmeros problemas para manter-se unida em torno de uma Obediência, cujos dirigentes realmente correspondessem aos anseios da totalidade dos Maçons.

Não há como discorrer sobre união sem antes citar os fatos históricos marcados pela desunião.

Mais do que a ambição natural do homem pelos metais, as disputas pelo poder e as vaidades têm talvez desempenhado papéis fundamentais nas grandes crises da Ordem, levando a cisões irreconciliáveis.

São raros os exemplos como o do Duque de Caxias, em meados do Século XIX, que, na qualidade de Soberano Grande Comendador do Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo e Aceito e Grão-Mestre do Antigo Grande Oriente do Império do Brasil, promoveu a incorporação de sua Obediência ao Grande Oriente do Brasil (GOB), abdicando de seu cargo e das prerrogativas inerentes.

Mas a História é repleta de cismas e conflitos internos, com destaque para dois episódios que marcaram o Século XX e cujos efeitos delineiam a atual Maçonaria regular no Brasil: a primeira na década de 1920 e na segunda na década de 1970. Com isso, além do Grande Oriente do Brasil (GOB), com jurisdição sobre todo o território nacional, há hoje a Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil (CMSB), que reúne Grandes Lojas de praticamente todas as Unidades da Federação, e a Confederação Maçônica do Brasil (COMAB), que congrega 21 (vinte e um) Grandes Orientes independentes estaduais.

As Obediências da CMSB e da COMAB, todas de âmbito estadual, preservam soberania e independência, ou seja, são confederadas, ao passo que o GOB permanece, desde sua criação, em 1822, como federado, isto é; com um Poder Central, hoje sediado em Brasília. Apesar disso, diz o adágio popular: “maçonaria se faz em Loja” e décadas de separação não foram determinantes para um distanciamento efetivo. Por isso, as práticas maçônicas disseminadas por essas três grandes vertentes são muito semelhantes, seja qual for a natureza: ritualística, filantrópica, paramaçônica, filosófica etc.

Em suma, é válido afirmar que as Lojas Maçônicas constituem as células de um único povo — com os mesmos costumes, princípios, objetivos, características e aspirações — que lamentavelmente se encontram separadas e são disputadas por diferentes governantes.

A conjuntura, todavia, é complexa e alguns fatores tornam muito difíceis desenvolver projeto com o objetivo de promover efetiva e completa reunificação.

Diferentes Obediências tratam de modo distinto a gestão do patrimônio imobilizado, dos recursos financeiros e de outros bens materiais como, mútuas, seguros de vida e seguros de saúde. Além disso, há a delicada questão dos reconhecimentos internacionais, com disputas que muitas vezes buscam excluir as demais, em busca de efêmero fortalecimento institucional. Some-se a tudo isso a pluralidade de ritos, que embora não configure, em si, nenhum problema, por vezes gera disputas desagregadoras, em especial entre os membros da alta administração.

2. Conjuntura

O final da Guerra Fria — caracterizado pela queda do Muro de Berlim, em 1989, e pelo fim da União Soviética, em 1991 — trouxe novos contornos à ordem global, construída a partir de 1648, quando o Tratado de Westfalia estabeleceu conceitos como o de Estado e de Nação.

Após o período da Revolução Francesa, iniciado em 1789, o Congresso de Viena (1815) agregou fatores de proteção e prerrogativas dos Estados.

Depois da 2ª Grande Guerra, criaram-se diversas instituições multilaterais para garantir a paz, a segurança e a ordem econômica e financeira mundial, tais como a ONU, o Banco Mundial e o FMI.

Nestas últimas décadas pós Guerra Fria, a história do mundo tem sido abalada por mudanças e revisões de conceitos antes paradigmáticos, principalmente relacionados à geopolítica, à soberania, à hegemonia, ao terrorismo e ao choque de civilizações.

Nesse quadro, destaca-se o papel primordial que as novas tecnologias estão desempenhando e, especialmente, o monumental desequilíbrio que poderá causar no cotidiano da humanidade, em todas as dimensões: política, econômica, social, tecnológica, militar e ambiental.

Nesta segunda década do Século XXI, o mundo ainda está fragmentado em cerca de 200 países, mas os Estados estão perdendo sua independência.

Na verdade, nenhum deles é capaz de executar políticas econômicas totalmente independentes e nem mesmo conduzir determinados assuntos internos, segundo o arbítrio de seus governantes.

Cada vez mais, estão sujeitos às maquinações do mercado global, à interferência de organismos internacionais e ao constrangimento do sistema jurídico internacional. Com isso são de certa forma, obrigados a se ajustar aos padrões globais de comportamento político, econômico e ambiental.

Poderosas correntes de capital, informação e trabalho transitam pelo globo de modo cada vez mais intenso, desconsiderando fronteiras e afrontando governos.

O império mundial que está sendo forjado não é dirigido por nenhum Estado ou grupo em particular e sim por uma elite multiétnica articulada por interesses comuns.

A todo instante profissionais das mais diversas áreas estão sendo convidados a ingressar nesse império e, de certo modo, abandonar seu povo e país de origem, optando assim, pelo império global.

Reações nacionalistas como a do novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump — anunciando que “os interesses dos EUA estarão acima de tudo” — e da Inglaterra, optando pela saída da União Europeia, tendem a acelerar esse processo e não retardá-lo, como alguns podem pensar.

Essa nova ordem em formação não é necessariamente virtuosa e, potencialmente, pode agravar ameaças, como o aumento da desigualdade, regionalismo exacerbado, drogas, violência, guerras localizadas, ataques cibernéticos, armas nucleares, mudanças climáticas, terrorismo, nacionalismo xenófobo e rejeição de refugiados.

Enquanto isso, no Brasil, governos, grande parte da sociedade e instituições como a Maçonaria permanecem alheios a essas mudanças.

Estamos, assim como a maioria dos países da América do Sul, na periferia das transformações econômicas e tecnológicas, afastados das principais cadeias internacionais de produção.

Neste “recanto do mundo” ainda são vivenciadas anacrônicas experiências socialistas, como a da Venezuela, que destroem as estruturas produtivas e sociais, atrasando em mais algumas décadas o alinhamento com as nações desenvolvidas.

Além disso, sucessivas crises internas brasileiras envolvem e absorvem decisores estratégicos e opinião pública nas emergências do cotidiano, jogando uma cortina de fumaça que impossibilita visões mais nítidas das prioridades atuais.

Diante desse panorama, apresentam-se para a Maçonaria brasileira oportunidades e ameaças.

Na qualidade de uma das mais antigas Organizações não Governamentais em atividade, reconhecida por instituições análogas de muitos outros países e com algumas dezenas de milhares de filiados em todo o território nacional, a Maçonaria poderá embarcar na onda de mudanças globais e assumir papel de destaque perante a sociedade brasileira.

Por outro lado, caso se mantenha alheia às transformações externas e envoltas em conflitos internos degradando as relações entre seus membros e agredindo o bom senso poderá, gradativamente, definhar em grande velocidade, não esperada sequer pelos mais pessimistas.

3. Proposta

Construindo óbvia analogia com os organismos internacionais, urge propor a REUNIÃO das três grandes vertentes regulares da Maçonaria brasileira — GOB, Grandes Lojas (CMSB) e Grandes Orientes independentes (COMAB) — sob a égide de uma nova organização de âmbito nacional.

Essa organização não deverá interferir na soberania e na administração material das entidades filiadas. Tampouco a ritualística seria pelo menos em princípio, alvo de alguma tentativa de padronização.

As principais finalidades seriam de mútuo reconhecimento e de representação internacional junto a instituições similares.

Além disso, os grandes problemas nacionais e mesmo locais seriam objeto de posicionamento adequado e articulado, permitindo à Ordem trabalhar conjugando-se esforços na busca de soluções concretas.

Por último, cuidaria para que as entidades filiadas não se afastem dos princípios de regularidade: os propugnados pela Grande Loja Unida da Inglaterra (GLUI); os difundidos pelo colegiado que reúne a Maçonaria regular Norte-Americana; e outros mais, peculiares ao contexto brasileiro, a serem oportunamente acordados entre os representantes das citadas vertentes nacionais.

Embora grande parte dos Irmãos considere essa proposta utópica, indicando ser quase impossível conciliar os múltiplos interesses dos governantes maçônicos, é lícito afirmar que o povo maçônico está cansado de assistir às lamentáveis disputas entre Irmãos, impulsionadas, muitas vezes, por exacerbada vaidade.

Um grande movimento de “baixo para cima”, isto é, das Lojas para as Obediências, poderá tornar-se realidade.

Contudo, é também possível que os dirigentes optem por liderar um processo dessa magnitude, não é mesmo?

No caso, a quem caberia tal iniciativa?

No entender deste autor, ao Grande Oriente do Brasil, a mais antiga Obediência maçônica nacional, maior do mundo latino e de onde se desligaram as demais Obediências citadas.

Assim sendo, considerando-se que:

• o Grande Oriente do Brasil (GOB) é soberano em sua jurisdição;

• inexiste governança internacional sobre Obediências Maçônicas regulares;

• a Grande Loja Unida da Inglaterra (GLUI) não exerce nenhuma
governança internacional sobre as Obediências por ela reconhecidas;

• caso o GOB venha a reconhecer Obediências Maçônicas regulares não reconhecidas pela GLUI, esse fato não deverá interferir nas relações fraternais entre o GOB e a GLUI;

• as Grandes Lojas da América do Norte não exercem nenhuma governança internacional sobre as Obediências por elas reconhecidas e constantes do List of Lodges;

• caso o GOB venha a reconhecer Obediências Maçônicas regulares, não constantes no List of Lodges esse fato não deverá interferir nas relações fraternais do GOB com outras Obediências constantes nessa publicação;

• o GOB reconhece como regulares as 27 (vinte e sete) Obediências Maçônicas pertencentes à Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil (CMSB), uma vez que constam na List of Lodges;

• a maioria dos Irmãos filiados ao GOB reconhece como regulares também as Obediências, Lojas e Irmãos pertencentes à Confederação Maçônica do Brasil (COMAB);

• a reunião dessas três grandes colunas da maçonaria regular brasileira — GOB, CMSB e COMAB — por intermédio do mútuo reconhecimento, traria força e vigor para a Ordem, perante a maçonaria internacional e junto ao mundo não maçônico;

• essa reunião expressa o desejo da maioria dos maçons filiados às três citadas vertentes;

• essa reunião traduz a manifesta vontade da maioria dos maçons filiados à Lojas que compõem o Grande Oriente do Distrito Federal;

• conforme o art. 166 do Regulamento Geral da Federação (RGF), o reconhecimento mútuo entre Potências maçônicas deve se dar por iniciativa do Poder Executivo, posteriormente ratificada pela Soberana Assembleia Federal Legislativa (SAFL);

• a Suprema Congregação da Federação é o órgão consultivo de mais alto nível do Grande Oriente do Brasil;

• conforme o art. 191 do Regulamento Geral da Federação, compete à Suprema Congregação da Federação discutir e propor soluções sobre assuntos maçônicos de interesse nacional do Grande Oriente do Brasil;

Propõe-se que:

• seja constituída uma comissão, no âmbito do GOB, composta de representantes de todos os Grandes Orientes estaduais e do Distrito Federal, bem como de representantes do Poder Central, para estudar e propor uma possível “Reunião da Maçonaria Regular Brasileira”;

• seja dado prazo para que essa comissão estabeleça as condições de regularidade maçônica, em âmbito nacional, tendo como base (cláusulas pétreas) os oito pontos de regularidade da GLUI;

• após isso, os Grão-Mestres estaduais e do Distrito Federal sejam orientados e autorizados a realizar contatos prévios com os titulares das Grandes Lojas, nas 27 (vinte e sete) Unidades da Federação brasileira, bem como com os titulares dos Grandes Orientes Independentes (onde houver), no sentido de solicitar que designem representantes para integrar comissão mista, destinada a propor possível “Reunião da Maçonaria Regular Brasileira”;

• mesmo que, em primeiro momento, não haja adesão de todas as Grandes Lojas e Grandes Orientes Independentes, os trabalhos da comissão devem tomar força e vigor, em prazo considerado adequado;

• o primeiro trabalho dessa comissão seja o estabelecimento das condições de regularidade maçônica, em âmbito nacional, com a concordância das Grandes Lojas e dos Grandes Orientes Independentes, tendo como base (cláusulas pétreas) os oito pontos de regularidade da GLUI;

• representantes do GOB, das Grandes Lojas e dos Grandes Orientes Independentes, como um todo, sejam designados para, em conjunto, realizarem contatos junto à GLUI e à Maçonaria da América do Norte, explicando a intenção de promover possível “Reunião da Maçonaria Regular Brasileira”, de modo a contar com o apoio dessas Organizações;

• que sejam oferecidas aos Grandes Orientes Independentes a possibilidade de, por adesão, submeterem-se à verificação das condições de regularidade;

• após confirmarem as condições de regularidade, sejam as Obediências da COMAB reconhecidas pelo GOB e pelas Obediências da CMSB;

• seja editada, em conjunto, a “Lista de Lojas Brasileiras”, sugerindo que todas sejam igualmente reconhecidas pela GLUI e pelas Obediências que, na América do Norte, editam o List of Lodges;

• a referida comissão estude e apresente proposta no sentido de criar uma entidade, em âmbito nacional, que — sem interferir na soberania e administração das citadas Obediências — represente a maçonaria regular brasileira perante a sociedade não maçônica e junto à maçonaria regular dos demais países;

• a entidade citada no item anterior leve em conta, quando do estabelecimento de suas condições de governança, a representatividade do GOB, como primeira e histórica Obediência maçônica nacional, reunindo cerca de 100 (cem) mil Irmãos.

4. Conclusões

O Beatle e poeta John Lennon, em uma de suas mais famosas canções “Imagine”, propõe um mundo melhor do que o atual, simplesmente sugerindo que as pessoas abdiquem de determinados interesses materiais e crenças espirituais, em benefício do bem comum.

Assim, como o autor dessa proposta, ele termina dizendo, em uma tradução livre: “você pode dizer que eu sou um sonhador; mas eu não estou só; espero que um dia você se junte a nós; e o mundo viverá mais unido”.

Que o G∴A∴D∴U∴ Abençoe a Maçonaria Brasileira.

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