1. Introdução

Se por um lado a independência da nação brasileira caminha para o seu bicentenário, por outro lado mais pesadas se tornam as correntes que impedem construir um presente justo e consequentemente semear um amanhã melhor. Enquanto o passado reserva um traje empoeirado de batalhas e glórias, o presente é marcado pelo individualismo e um atordoado movimento de se desejar mudança, porém terceirizando sua realização. Na paisagem triste desse cenário está a maçonaria, que atravessa suas próprias crises, e não demonstra ter as mesmas forças de outrora para romper os grilhões que sufocam a independência de um povo livre.

2. Acorrentados ao individualismo

Existe um mito em torno do progresso. Muitos pensam que a evolução e o progresso trouxeram uma realidade pior que a vivida no passado. Na verdade, a evolução e o progresso trazem inúmeras melhorias, porém o problema é o que o homem de fato absorve e transforma em legado.

Está escrito em algum lugar que as redes sociais deveriam isolar as pessoas? Imagino que não, porém o homem, a partir das evoluções tecnológicas, criou o lastimável labirinto de ‘solidão coletiva’. Aliado a isso, ocorreu o retrocesso de saber viver em comunidade. Há 20 ou 30 anos atrás era comum nascer e crescer em bairros horizontais, vivendo em comunidade e percebendo a importância das lideranças locais. Era o líder comunitário que ia até a prefeitura requerer asfalto, iluminação, posto de saúde, praça, escola e segurança. Com um pouco mais de esforço esse mesmo líder viria a se tornar um vereador e crescer na carreira política.

Atualmente, com a proliferação das moradias verticais, uma das maiores dificuldades da convivência num condomínio é conseguir alguém para ocupar a função de síndico. Cada morador do prédio já está transbordando de preocupações com trabalho, compromissos financeiros, educação dos filhos, angústia sobre aproveitar o tempo. Dessa forma, o sentimento de contribuir no prédio que mora dá lugar a um pensamento “O que eles decidirem está bom!”. Se o indivíduo tem as condições básicas (perto do semiluxo) isso é o suficiente para deixar a política no piloto automático, até aquela mais próxima que é a gestão do condomínio.

Não participando da gestão do condomínio, mais distante fica a atuação comunitária, municipal, estadual e federal. Com o individualismo, o homem só se posiciona em dois lados: (I) o lado que não se envolve, pois está na zona de conforto; e (II) o lado que se envolve porque quer chegar a sua zona de conforto.
Como pensar em progresso, renovação da representação política, grandes feitos, visão de longo prazo, se a cada um somente interessa o seu bem-estar?

3. Acorrentados ao “Brasil que eu quero” e não ao “Brasil que eu faço”

A avalanche de vídeos sobre o “Brasil que eu quero” invadiu emissoras de televisão, rádio, e outros meios de comunicação, divulgando desejos de uma nação assolada por uma inquestionável rede de desigualdades. Até aqui tudo bem, mas o problema começa a aparecer quando alguém diz: – Quero um Brasil sem corrupção! Por outro lado, essa mesma pessoa fura fila no médico, não devolve troco quando vem a maior, não vê problema em subornar um guarda para não receber multa no trânsito, comemora o título esportivo do seu clube mesmo que sob a moldura de uma decisão desastrosa de um juiz.

Outra situação é quando alguém diz: – Quero um Brasil com mais empregos! Em regra geral essa pessoa está muito próxima do desemprego, porque se estivesse empregada, sua frase seria: – Quero um Brasil com mais benefícios ao trabalhador!

E outro ainda diz: – Quero um Brasil com mais educação! Porém essa mesma pessoa sequer tenta ler um jornal aos finais de semana e quiçá um livro por ano.

E assim, os exemplos seguiriam páginas e páginas de se postular num tom individualista “O Brasil que eu quero”. Mas e o Brasil que eu faço?

A distância entre um e outro parece simbólica, mas ao trocar o querer por fazer surge a possibilidade de se dirigir ao próximo. Surge a chance de construir algo que não se limite ao proveito de um só. Outro ponto importante dessa diferença é que ao falar do Brasil que eu quero, está se delegando a solução a um terceiro, enquanto que ao falar do Brasil que eu faço, a solução está nas próprias mãos.

Daí, como imaginar uma realidade diferente da vivida hoje se a solução está delegada a um terceiro (político, etc.) e a ação das próprias mãos e atitudes não está sendo considerada?

4. Maçonaria: Porta larga ou estreita?

Não é demais lembrar que na maçonaria as paixões são submetidas, evitando o domínio do homem pelas suas emoções. Também aqui, busca-se a edificação das virtudes e a erradicação dos vícios. Vale ainda dizer que não há espaço para diferenças políticas e religiosas, ressaltando que o Maçom deve crer num Ser Supremo que é Deus. Esse breve resumo representa a moldura de uma instituição milenar, filosófica e progressista que se fez representar nas páginas da história pelos seus grandes feitos.

Ingressar na maçonaria era (e ainda é para alguns) motivo de honra e distinção para uma família, pois era sinônimo de ser escolhido entre muitos. Infelizmente, com o adoecimento da sociedade, seja diante do individualismo, seja pelo comodismo, seja pela deterioração da religiosidade em razão da transformação cultural, o homem também adoeceu e muitos desses homens estão entre as colunas da Ordem.

E por que tais homens, admitidos como livres e de bons costumes, porém atingidos de patologias sociais, estão em nossos templos? Ousaria dizer que se a porta fosse estreita como em outrora, a maçonaria teria templos ainda mais vazios do que já se tem na atualidade.

Lamentavelmente, com a porta mais larga, o risco que se expõe é a qualidade dos candidatos admitidos, podendo resultar em jornadas curtas, limitadas a curiosidade e colocadas em segundo ou terceiro plano quando há que se romper sua zona de conforto e/ou o individualismo para servir aos propósitos da sua oficina, do seu Oriente.

O ponto crítico desse cenário é que a maçonaria antes uma rompedora de grilhões, agora está inerte em suas próprias correntes. Se um dia a história registrou José Bonifácio, Gonçalves Lêdo, Dom Pedro I, Rui Barbosa, Monteiro Lobato, Padres, Pastores, Freis e muitos outros, quantos acontecimentos políticos, culturais marcaram época!

Com a porta larga de entrada, o objetivo da Ordem não consegue mais interferir no desenvolvimento social e político, mas sim tentar manter-se de pé, evitando sucumbir aos efeitos de uma sociedade culturalmente ansiosa, individualista, imediatista e progressivamente distante de Deus.

Como romper esses grilhões e voltar a ocupar o lugar de destaque que repousa nas páginas amareladas da história?

5. Considerações Finais

O presente trabalho teve por objetivo apresentar algumas breves reflexões sobre ‘o grau de independência’, abordando na percepção do Irmão autor, que para viver a independência há que se libertar de correntes extremamente densas, quais sejam: (I) individualismo do homem; (II) delegação a terceiros da ação que depende de você; (III) atual estado de crise da maçonaria impedindo maior participação na transformação social e política brasileira.

Caminhando para alcançar em breve o bicentenário da independência do Brasil, não é demais lembrar e alertar que as instituições historicamente representativas tiveram domínio ora bélico, ora científico, ora político e até mesmo religioso.

As perguntas que repousam com o presente trabalho são: – Onde estará a maçonaria quando a história de 200 anos do Brasil for escrita? Estará ainda, acorrentada às dores de uma instituição milenar sujeita as patologias sociais ou estará criptografada na moldura de um Brasil diferente e melhor?

Diante de todo o exposto, na certeza de não ter esgotado o tema, mas ter sim alcançado o acolhimento e provocado reflexões entre os Irmãos, é o desejo que o G∴A∴D∴U∴, mantenha a Luz da Sabedoria apontada em nossas vidas, prevalecendo à tolerância e a habilidade de ‘saber cuidar’ entre Irmãos.

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ARBLS Prof. Hermínio Blackman, n° 1761 Oriente de Vila Velha • GOB/ES

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