1. Introdução Talvez seja muita pretensão falar desse tema tendo menos de uma década de ingresso e atividade na Ordem. Por outro lado, como o debate é dinâmico e necessário, não tenho a pretensão de concretar uma verdade, mas colocar um tijolinho na edificação da sua busca. O objeto desse debate versa sobre o ingresso de novos Irmãos, semeando perguntas para alcançarmos uma ampla reflexão. A motivação em abordar tal tema surge com a observação da gradativa redução do número de iniciações nos Orientes, sem entrar no mérito da continuidade de criação de novas lojas, pois o resultado de uma forma geral vem sendo uma média cada vez menor de Irmãos por oficina, alcançando o extremo de muitas dessas não conseguirem com seu próprio quadro iniciar os trabalhos de uma sessão, dada a falta de obreiros. 2. O que mudou? A Maçonaria? Parece oportuno iniciar por essa ampla pergunta. Afinal, pensemos, a Maçonaria mudou? Num primeiro momento penso que não, visto que os valores e tradições permanecem os mesmos, o que abrange sua discrição. No entanto, se avaliarmos pelas obras, vejamos. Nos dois séculos anteriores quantos países conquistaram sua independência através de movimentos maçônicos? Quantos fatos históricos e ações políticas tiveram em seus bastidores a harmonia de uma orquestra de nossos virtuosos irmãos? Bem, a lista de exemplos para justificar a resposta positiva nas duas perguntas acima daria outro relevante trabalho, e podemos imaginar sua extensão. Pois, agora pensemos em responder essas perguntas olhando o século atual. Seria igualmente extensa a lista de realizações? Creio que não, talvez por desconhecimento, e lamento por isso. O fato é que tais realizações abrilhantam os livros de história e durante muitos anos ingresso na Ordem era, dentre outras coisas, um ato nobre, pois o novo membro se juntaria a galeria desses valorosos Obreiros. Não que isso tenha mudado, mas as páginas da história vão amarelando ano após ano e esse encanto adormecendo ao calor do manto do esquecimento, pois a dinâmica das informações nos dias atuais é tamanha que um fato importante pode ser esquecido em dias ou meses, o que dirá em anos ou décadas. Aliada a dinâmica das informações, o próprio posicionamento da Maçonaria na Era da Informação e do Conhecimento é algo que requer planejamento e constante avaliação. Qual o limite para atuação na internet e nas diversas redes sociais? Ao menos podemos convencionar a certeza de que dificilmente o futuro de uma organização será escrito sem que haja uma estratégia de comunicação, pois cada vez mais para existir não basta apenas estar erguido, mas é necessário ser percebido e destacar-se adequadamente percebido. Essa breve constatação responde em parte a pergunta que inicia esse tópico. Afinal, a Maçonaria mudou? Não! Porém a forma de suas obras serem percebidas e a percepção sobre a própria instituição em si, isso sim mudou. E por que isso ocorreu? Simplesmente porque o homem, que é quem percebe, também mudou e muda cada vez mais rápido. 3. O homem muda em alta velocidade e sem freio Muitas são as formas de abordar e perceber as mudanças do homo sapiens. Certamente é outro tema que seja pela Sociologia ou Antropologia, daria um relevante trabalho. Deterei a partir da visão do homo sapiens utilizando o conceito de ‘mundo, modernidade e sociedade líquidos’ do saudoso pensador Zygmunt Bauman. Na visão desse sociólogo, o homem assumiu uma posição de individualidade e ao mesmo tempo dependência do consumismo e da necessidade de percepção de sua existência pelos outros. De certo que não citei nem 1/10 de sua ampla e preciosa obra, mas para o propósito do presente trabalho será suficiente. Nos dias atuais, o homem vive uma contínua saga de sobrevivência e esgotamento. Primeiramente, não tem tempo, ou, melhor dizendo, o tempo é constantemente insuficiente para fazer tudo aquilo, que considera necessário fazer. Ainda nos dias atuais, e no clima de sobrevivência, o homem está cada vez mais se distanciando da necessidade de ser coletivo e apostando alto na individualidade como forma de sobressair nas batalhas profissionais. Trabalhando incansavelmente e escalando os méritos da individualidade, os brindes desse homem são com as taças do consumismo, desfrutando quando pode os prazeres que sua posição oferece. Todavia, nem todos que trabalham e não tem tempo estão numa posição tão favorável assim, e aqui reside a grande massa, pois o consumismo aparece como forma de agrupar as pessoas e criar redes de relacionamento ou simplesmente de exclusão ou inclusão. Nessa teia, o homem está constantemente se refazendo e desfazendo, pois do contrário é excluído do meio em que interage no dia-a-dia. Bem, mas por que isso tem relação com o ingresso de novos irmãos na Maçonaria? Optando por uma das várias vias, podemos dizer que durante décadas havia um perfil que era estudado, avaliado e com cautela ocorriam indicações, o que levava tempo. Nos dias atuais, uma das primeiras constatações é que ‘esse perfil’ está cada vez mais escasso já que o homem está constantemente mudando, e o tempo de estudar e avaliar colide com a ansiedade e imediatismo dessa geração. Logo, o que antes levava um ou dois anos agora deveria levar um ou dois meses. Levar um ou dois meses não seria o maior problema, mas sim se esse período seria necessário para uma avaliação assertiva sobre as qualidades do candidato que o tornaria digno de ingressar na Ordem. Daí, além da escassez do perfil, temos o crescente risco de acolher irmãos que em pouco tempo estariam deixando o quadro, não só da sua oficina, mas da Ordem. Não é por menos que uma das características predominantes, no perfil do ingressante nos dias atuais, compreende homens aposentados, ou, no mínimo acima dos 40 anos, pois essa fatia da sociedade ainda pertence a gerações pré-ansiosas e imediatistas. Como a tolerância e a serenidade do perfil maçônico podem duelar com o imediatismo e ansiedade dessa geração? Essa pergunta é apenas a ponta de um iceberg ainda maior, mas sua resposta ficará endereçada a outro trabalho. O fato é que em regra geral o time que vem sendo formado está cada vez mais veterano, o que pode preocupar em longo prazo. Se de um lado temos essas constantes mudanças no comportamento humano criando uma névoa que impede identificar novos possíveis Irmãos dessa geração, por outro lado temos o ingresso maduro, porém com capacidade de produção/atividade menor, pois poucos mantêm os vigores no período de aposentadoria. Agrava um pouco mais esse quadro a perspectiva da reforma previdenciária que aumenta a idade para 65 anos, deixando aqui mais um tema de análise. Todavia, outro ponto merece destaque. Só se aproxima ou desperta interesse quando alguém conheceu algum parente maçom ou pessoa próxima. Essa pessoa, sem muita dúvida, vem correspondendo ao maior percentual de ingressantes. Do contrário, se a pessoa não teve contato com ‘nada’ de maçonaria, mesmo que se interesse quanto aos aspectos filosóficos, acaba por desanimar quando é informado dos compromissos financeiros a serem assumidos, que por mais que não seja exorbitante, essa pessoa coloca tais compromissos no mesmo nível das contas que já possui ficando no mesmo grau da conta de condomínio, energia, financiamento, etc. Daí pensa: – Mais uma conta pra quê? 4. Quantas agulhas, temos no palheiro? Depois de abordar que a percepção sobre a Maçonaria (e suas obras) mudou ao longo dos anos e que o homem segue uma ‘metamorfose ambulante e sem freio’, a pergunta permanece ardente: Como encontrar novos Irmãos? Obviamente que em se tratando de opinião, podem existir muitas maneiras, porém irei abraçar algumas pequenas sugestões. A primeira é que devemos atrair possíveis candidatos com nossos exemplos e atitudes. Afinal, onde teríamos maior chance de conhecer alguém: numa jornada de bares ou num grupo que realiza trabalhos de caridade? São extremos, mas serve como exemplo. Imagine que você como maçom carrega a imagem da Ordem contigo em qualquer lugar. A embriaguez, a exposição pública não é só sua, mas também da instituição que representa. Além disso, se por um instante havia alguém interessado em ingressar, certamente com seu desastroso exemplo, essa pessoa irá pensar mais algumas vezes, antes de desistir. Ainda exemplificando, recordo-me que durante algumas fases da Operação Lava Jato, recebi várias vezes informações no WhatsApp de que o Juiz Sérgio Moro era maçom. Sem entrar no mérito se há verdade nessa afirmação, me chama a atenção o quanto a atitude dele em fazer justiça se tornou uma moldura para colocarmos um ‘exemplo’ de líder maçom. Certamente, muitos teriam orgulho de ingressar numa organização e poder chamar alguém como ele de Irmão. Agora, pensemos o inverso e veja qual seria o efeito de alguém condenado na Lava Jato ser identificado como membro da Ordem. Que efeito isso causaria? Quantos desejariam manter a maior distância possível de uma organização que possui pessoas dessa estirpe? A segunda sugestão passa pela comunicação e divulgação das obras, pois em tempos de crise, você conseguir força para manter e/ou administrar hospitais, escolas, asilos, creches (etc) é algo muito positivo que desperta no mínimo a curiosidade em conhecer como que uma organização sem fins políticos e lucrativos consegue fazer tais obras. Importante destacar que a divulgação é das obras e não das pessoas envolvidas, sendo muito mais um balanço social do que uma propaganda. Por fim, não se trata de uma sugestão, mas de um desafio. Quando foi abordado as condições do comportamento humano, que fique claro não existir uma linha divisória entre a organização maçônica e a sociedade. Estamos juntos e misturados e por assim ser, temos um desafio diário de não se deixar vencer pelas patologias sociais desses nossos tempos, quais sejam, o individualismo, consumismo, imediatismo, dentre outros. Pois do contrário, além de um número menor de ingressantes, a maçonaria, enquanto instituição poderá adoecer se tais sintomas estiverem presentes em nossas oficinas. 5. Considerações Finais Esse breve relato ou ensaio teve por objetivo apresentar algumas reflexões sobre ‘o ingresso de novos Irmãos’. O propósito é provocar e situar o leitor em alguma(s) das abordagens apresentadas e abrir caminho para novos debates acerca do tema. É sabido que potencialmente o novo Irmão pode estar em todo lugar, ou seja, nas Universidades, ambientes de trabalho, ambientes religiosos, grupos sociais e outros. A diferença quando comparamos com épocas passadas é que a percepção sobre a Maçonaria, enquanto instituição e suas obras estão amareladas e empoeiradas, o que nos remete a cautela de destacar os valores no mínimo das Lojas que fazemos parte. O que não mudou é nossa responsabilidade de ser a principal propaganda da Ordem, e isso sem dúvida é um poderoso imã para reunir as poucas agulhas num palheiro em constante movimento. Por fim, a comunicação e a atuação na internet e redes sociais pode também ser uma estrada ou uma janela para inovar ou atualizar a percepção sobre a instituição, realçando suas obras sem prejudicar a discrição como valor sólido. É certo que em nenhum momento as reflexões desse ensaio não desejaram apontar a necessidade quantitativa de ingressos, mas antes da quantidade, discorrer sobre a dificuldade qualitativa dos ingressos, pois o amanhã e o longo prazo dependem dessas sementes. Na esperança de ter contribuído e na certeza de não esgotar o tema, acredito que o debate deve se manter com a chama acesa, e que novas páginas sejam preenchidas com o valor dos atuais e novos obreiros. 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