Talvez um dos temas mais polêmicos e delicados a serem enfrentados pela Ordem Maçônica atual é a inclusão das mulheres na condição de obreiras ativas de Lojas e Potências Maçônicas regulares e reconhecidas.

Objeto extremamente delicado, o qual leva, muitas vezes, às discussões acaloradas, chegando, às raias da loucura de ofensas pessoais entre Irmãos, com acusações de serem uns sexistas e retrógrados, enquanto outros serem denominados de perjuros.
Sinceramente, é um caminho nebuloso que demandará muita reflexão e sabedoria, por parte de nossas autoridades e gestores maçônicos, já que a decisão que vier a ser tomada no futuro poderá levar à algumas consequências preocupantes, seja por qualquer uma das vertentes, a favor ou contra o reconhecimento do direito de ingresso das mulheres na Ordem Maçônica regular.

Em primeiro lugar, não podemos negar que as mulheres detêm capacidade – em geral, até mais habilidades e qualidades do que nós, homens – de galgar assento em nossos Templos, enriquecendo o pluralismo das discussões com suas visões aguerridas, multifuncionais, empreendedoras e determinadas.

É inquestionável que elas nos complementariam, de forma com que nos favoreceria com suas capacidades dualistas, alternativas e inovadoras, agregando valor à forma de pensar rígida com que nós, homens, concebemos o mundo.

Não se esqueçam, ainda, que nossa Ordem é progressista e que o valor da mulher na sociedade atual e sua importância para a evolução da humanidade é inexorável, fazendo com que, na conjuntura recente, sua inclusão no âmago de nossa Instituição seria um reconhecimento ao júbilo de sua relevância, como Construtoras da Humanidade.

Desta forma, relegá-las para um segundo plano, num papel menos importante, seria mantê-las nas brumas da escuridão, desmerecendo e desprestigiando sua luta para buscar seu real lugar ao sol.

Isto tudo é muito compreensível e, do ponto de vista emocional, estes argumentos, confesso, chegam a estremecer minha opinião acerca do tema, principalmente se considerarmos que os rumos e objetivos da nossa Sublime Instituição estão em fase de profundas alterações.

Contudo, alguns apontamentos devem ser feitos, os quais, em razão de minha visão jurídico-profissional, como advogado, tendo a crer que necessitamos, ainda, de muita discussão sobre a questão apontada.
O primeiro ponto que se deve destacar é que, em 1929, a Grande Loja Unida da Inglaterra (GLUI) aprovou 8 (oito) princípios básicos para reconhecimento da regularidade de uma Grande Loja, dentre os quais, no item 4, prevê-se que “os membros da Grande Loja e das Lojas individuais serão exclusivamente homens; e que cada Grande Loja não terá qualquer relação Maçônica de qualquer tipo de Loja mista ou corpos maçônicos que admitam mulheres como membros”.

Ou seja, na atualidade, é critério sine quo non para que uma Potência Maçônica pleiteie seu reconhecimento internacional junto à GLUI, sendo declarada regular, que todos seus membros sejam do sexo masculino, não mantendo relação de reconhecimento e intervisitação com corpos “maçônicos” mistos ou puramente femininos.
Neste sentir, há um entrave normativo maçônico no sentido de que uma Potência regular viesse a permitir o ingresso de mulheres em seu seio, uma vez que, ocorrendo isso, a mesma, muito possivelmente, passaria por um procedimento de perda do reconhecimento junto à GLUI e às outras Potências regulares mundiais que reconhecem e são reconhecidas pela GLUI.

Frise-se que não se barra, tão somente, o ingresso da mulher nos quadros de obreiros de uma Potência regular, com reconhecimento internacional junto à GLUI, mas, também, a simples manutenção de relação maçônica, de qualquer tipo, com Lojas mistas, femininas ou corpos maçônicos que admitam mulheres como membros, inclusive a intervisitação e troca de comunicações oficiais.

Por óbvio, é uma escolha interna da Potência regular que queira tomar a decisão, mas sem sombra de dúvidas é uma decisão – na visão atual – um tanto quanto temerária, já que afetará todos seus membros, recaindo na irregularidade e na quebra de vários tratados de mútuo reconhecimento e livre visitação.

Mas não é somente esse ponto que merece a atenção e luz, já que nossa tradição maçônica, principalmente nossos juramentos prestados conscientemente, durante nossa jornada junto à Sublime Instituição, nos induz a respeitarmos, invariavelmente, aos landmarks que nossas respectivas Potências Maçônicas acolhem como válidos.
Os landmarks, como sabemos, são o conjunto de regras que regem a Ordem, de acordo com o entendimento de seus escritores, traduzindo as normas “gerais e imutáveis” que devem os maçons, respeitar e obedecer.

Não são pacíficos e nem unificados, sendo que variam de autores para autores, porém suas instituições, geralmente, são lastreadas em requisitos de antiguidade, espontaneidade e generalidade e invariabilidade e irrevogabilidade.

Não querendo enveredar pela senda da discussão sobre a origem, validade e aplicação dos landmarks em cada Potência, necessário é se prender ao fato de que, para a Maçonaria regular brasileira, em sua esmagadora maioria, se utiliza e acolhe, como válidos e legítimos, os 25 (vinte e cinco) regramentos maçônicos instituídos por nosso saudoso Irmão Albert Gallatin Mackey.

Pelo 18.º landmark de Mackey, “todo candidato à iniciação deve ser homem (com letra minúscula, indicativo de gênero) livre de nascimento não mutilado ou isento de defeito físico e maior de idade” demonstrando que há um princípio geral proibitivo de que uma mulher possa vir a ser acolhida como membro ativo de uma Potência regular que se utilize dos marcos imutáveis, descritos por Mackey e aceitos por nós sob juramento conscientes.

Aliás, este landmark de Mackey encontra respaldo e correspondência em outros landmarks escritos por outros autores maçônicos, os quais são utilizados por outras Potências regulares, tais como a obrigação de se iniciar “homem” livre e de bons costumes, elencado no 4.º landmark de nosso Irmão Joseph Gabriel Findel; ou o 7.º landmark de nosso Irmão Roscoe Pound; ou o 4.º landmark de nosso Irmão Jean-Pierre Berthelon, dentre outros.

Repise-se, não é questão de desmerecer o valor da mulher na sociedade atual e sua importância para a evolução humana, em todos seus aspectos, mas a progressão e aprofundamento dos debates sobre o tema abordado necessita, obrigatoriamente, perpassar pela barreira legal infligida pelas normas pétreas de constituição, regularidade e reconhecimento da Ordem.

Mas não bastaria que apenas uma Potência regular reconhecesse o direito de ingresso da mulher em seus quadros, a mudança da consciência histórica, da cultura, dos regramentos antigos, de nossas ordenanças, nossos marcos “imutáveis”.

Frise-se que uma Potência regular que assim o quisesse fazer deveria, para fundamentar sua decisão, deixar e adotar um conjunto específico de landmark e escrever outros, os quais, passariam a ser os seus próprios, ou, ao menos, acolher um novo conjunto de landmarks que acolhesse a possibilidade ou, ao menos, não proibisse o ingresso das mulheres em seus quadros (por exemplo, os do Irmão Albert Pike, que é omisso sobre o tema).

Porém, o fazendo, havendo a revogação da adoção de seus landmarks utilizados para se adequar aos interesses de incluir as mulheres em seu seio, não se refutaria a possibilidade, de ser declarada irregular pela GLUI e demais Potências regulares, com possível denúncia de seu respectivo tratado de mútuo reconhecimento e livre visitação. Não seria um preço alto a se exigir de todos seus maçons jurisdicionados? Não seria mais um motivo de nova cisão?

A discussão, realmente, é interessante e intensa, não bastando os arrazoados e fundamentos maçônicos, mas passam também, e acredito muito mais próximos, do efetivo exercício da prudência, da sensatez e profunda reflexão, em busca de uma decisão que seja harmoniosa e não sectária.

Acreditem, mais vale a manutenção da ordem atual, prevalecendo a tolerância e a valorização da importância da mulher para nossa Instituição como ponto de apoio ao desenvolvimento do homem e da Humanidade, do que ingressarmos em uma “guerra” ideológico-sexista, onde, realmente, desconhecemos a certeza do futuro e dos seus arriscados efeitos.

Não que elas não mereçam muito pelo contrário, acredito que as mulheres sejam muito mais preparadas e detentoras de altas capacidades do que nós, homens. Mas muitos de nós trocaríamos, com certeza, uma boa contenda visionária e platônica pela paz universal da manutenção de nossas tradições, usos e costumes.

Não é fugir do bom combate ou das discussões necessárias do progresso, mas sim buscar a manutenção salutar de nossa Instituição, evitando-se novas e desnecessárias cisões.
As mulheres são especiais por si próprias e a busca pelo conhecimento pessoal e de sua participação no trabalho evolutivo da Humanidade pode se dar de várias formas, por vários métodos e sistemas, junto a outras Instituições seculares belíssimas e tão – ou mais importantes – que a Maçonaria regular. Convivamos harmonicamente em paz! Apenas um pensamento.

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AELS Obreiros da Paz, n° 19 Oriente de Bujari • GLEAC/CMSB